Há quatro anos, nesta mesma época do ano os institutos de pesquisa Datafolha, Ibope, Sensus e Vox Populi dividiram-se em dois grupos distintos, um composto pelos dois primeiros institutos citados e o outro, pelos dois últimos. Esses grupos travaram uma guerra estatística. Vejamos como estava a corrida pela sucessão presidencial em cada instituto no período de abril a maio de 2010.
O Vox Populi divulgou pesquisa do período de 30 a 31 de março. Nessa pesquisa, Dilma e Serra estavam tecnicamente empatados – ela aparecia com 31%, o tucano com 34% e Marina com 8%. Como a margem de erro da pesquisa era de 2 pontos, Dilma poderia ter 33% e Serra, 31%
O instituto Sensus divulgou pesquisa do período de 5 a 9 de abril de 2010. Dilma apareceu com 34% das intenções de voto, José Serra com 36,8% e Marina Silva com 10,6%. Estavam tecnicamente empatados.
O Ibope divulgou pesquisa do período de 13 a 18 de abril. Dilma tinha 32%, Serra 40% e Marina 9%.
O Datafolha divulgou pesquisa do período de 15 a 16 de abril. Dilma tinha 29%, Serra 40% e Marina 11%. Nesse instituto, Serra tinha incríveis 11 pontos de vantagem sobre a principal adversária em um momento em que, depois se soube, ela o estava ultrapassando.
Em 14 de maio de 2010, o jornal Folha de São Paulo atacou a pesquisa Sensus dizendo que ela detectara Serra e Dilma praticamente empatados porque apresentara questionário que “esquentava” o entrevistado, ou seja, que fazia perguntas antes de perguntar em quem o entrevistado iria votar que induziam a sua resposta.
Aqui, reportagem da Folha que atacava o instituto concorrente do seu.
Entre abril e maio de 2010, os institutos de pesquisa dividiram-se entre os que diziam que Dilma e Serra estavam empatados e os que diziam que o tucano mantinha a dianteira. Essa polêmica só chegou ao fim após a ONG Movimento dos Sem Mídia, no dia 12 de maio, ter conseguido que a Polícia Federal abrisse inquérito para investigar os quatro institutos de pesquisa.
Aqui, reportagem do portal IG sobre o caso.
Após a abertura do inquérito, a pesquisa seguinte do Datafolha finalmente convergiu para os números dos institutos Vox Populi e Sensus, que mostravam Dilma empatada ou tecnicamente empatada com Serra.
Em pesquisa no período de 10 a 14 de maio de 2010, o Sensus mostrou Dilma com 37%, Serra com 37,8% e Marina com 8%.
Em pesquisa no período de 20 a 21 de maio, agora com investigação sobre pesquisas correndo na Polícia Federal, o Datafolha detectou Dilma com 36%, Serra com 36% e Marina com 10%.
Em 31 de maio, o Ibope também convergiu para o Sensus e o Vox Populi e mostrou Dilma empatada com Serra, ambos com 37%, e Marina com 9%.
O instituto Sensus, após a acusação da Folha, só voltaria a publicar pesquisa sobre o período de 31 julho a 2 agosto. Agora, Dilma já tinha 10 pontos de dianteira sobre Serra, com 41,6%, enquanto ele pontuava 31,65% e Marina, 8,55%.
O período de abril e maio de 2010 foi crucial para a última campanha eleitoral a presidente da República porque ali estava ocorrendo um processo de definição dos votos do eleitorado, de posicionamento desse eleitorado.
Em cerca de um mês, Serra perdeu toda a vantagem que tinha sobre Dilma, mas uma suposta falsificação de pesquisas poderia ter mudado essa história.
O sociólogo Carlos Alberto de Almeida publicou um trabalho acadêmico em livro sob o título “A Cabeça do eleitor” (Editora Record). Com base em estudo de 150 eleições, ele detectou o poder que as pesquisas eleitorais têm sobre as pessoas.
A teoria de Almeida sobre “a opinião dos outros” mostra que dianteira nas pesquisas pode carrear votos para um candidato. As pessoas tenderiam a apostar em quem tem mais chance de vencer.
Eis que, em 2010, a contraposição de Sensus e Vox Populi a Datafolha e Ibope, aliada à representação do Movimento dos Sem Mídia ao Ministério Público Federal que fez a PF abrir uma investigação, pode ter feito Datafolha e Ibope convergirem para Sensus e Vox Populi, mudando a história daquela eleição.
Nesse contexto, na semana que passou duas pesquisas eleitorais, apesar de apresentarem resultados parecidos, sugerem que a guerra entre pesquisas de 2010 pode ter uma reedição nas próximas semanas.
Na última quarta-feira (16), o instituto Vox Populi divulgou pesquisa que mostra Dilma em situação muito mais confortável do que neste período de 2010. Com 40% das intenções de voto, tem quase o dobro dos 26% dos adversários somados. Seria reeleita em primeiro turno, se a eleição fosse hoje.
Na quinta-feira (17), o instituto Ibope divulga pesquisa que poderia ser praticamente idêntica, pois os adversários de Dilma, somados, têm os mesmos 26% que no Vox Populi, mas a presidente aparece com 37%, com três pontos a menos que no mesmíssimo Vox Populi.
O que é estranho, portanto, é o Ibope e o Vox Populi apurarem exatamente os mesmos percentuais de intenção de voto para os adversários de Dilma, mas divergirem sobre o percentual dela. Ou alguém está aumentando artificialmente o percentual de Dilma ou está reduzindo…
A história recente (2010) sugere que, em 2010, o Vox Populi e o Sensus previram antes de Datafolha e Ibope a ultrapassagem de Serra por Dilma, mas mostra que o Datafolha foi o único que detectou que a eleição iria para o segundo turno.
Contudo, o “erro” de Vox Populi, Sensus e Ibope sobre ter ou não segundo turno em 2010 se deu por conta de uma diferença infinitesimal de votos que postergou por mais algum tempo a quase inevitável primeira eleição de Dilma, enquanto que, ao longo de abril, o Datafolha e o Ibope chegaram a dar uma vantagem de até 12 pontos para Serra sobre Dilma em um momento em que ela estava passando por ele como um foguete…
O PT precisa estar muito atento ao uso de pesquisas nas próximas semanas. E não basta ter as suas pesquisas internas. As pesquisas dos grandes institutos, que ganham grande publicidade, podem ser usadas para induzir o eleitorado, para criar aquela sensação de “virada” dos adversários de Dilma. Se não houver contraponto público, a coisa pode complicar.
Não me surpreenderia se Datafolha e Ibope aparecerem, logo mais, mostrando uma “reação” de Aécio e Eduardo Campos contra Dilma. Se esses institutos “de oposição” repetirem o que fizeram em 2010 e não houver contraponto como naquele ano, podem induzir o eleitorado.
O PT não pode cochilar. O potencial de indução de voto das pesquisas é um fenômeno muito concreto. Se ficar dormindo quando as pesquisas começarem a ser usadas para valer para influir na cabeça do eleitor, poderá acordar só quando o efeito dominó for irreversível.
Por Eduardo Guimarães/247